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Reportagem mostra os riscos da exploração de petróleo na Amazônia

01/12/2023

Texto de Vitória Barreto

Em meio a uma agenda conturbada nos últimos anos, marcada inicialmente pela crise dos respiradores durante a pandemia, uma seca histórica no Rio Negro e recentemente a densa névoa que encobriu Manaus, a preocupação mais urgente é o desafio invisível que ameaça as profundas águas da bacia do rio Amazonas: uma exploração de poços de petróleo na região. A Petrobras pretende perfurar um poço no bloco FZA-M-059, localizado a cerca de 175 km da costa do Amapá e a 560 km de distância da foz do Rio Amazonas para verificar a presença de petróleo. Em maio, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) recusou uma concessão de licença para atividades de exploração na área, o que desencadeou debates públicos, reforçados por diferentes ambientalistas.

O Ibama apontou lacunas no pedido da empresa petrolífera, como a precisão de impactos da atividade em três terras indígenas no município de Oiapoque, no Amapá. Questões como a concentração de renda e o crescimento urbano desordenado são preocupações recorrentes nessas áreas. Marcelo Laterman, ativista sênior de campanhas sobre clima e energia do Greenpeace, afirma que quando visitou a região da possível exploração, em junho, já identificou efeitos socioambientais indiretos à exploração que afetam a região. Ele prevê invasão da terra indígena e afirma que já existem falsos cursos técnicos para aqueles que desejam trabalhar na exploração, além de uma movimentação incomum que afeta as populações locais.

"O helicóptero voava baixo e afugentava toda caça dos indígenas, da qual são dependentes. O problema é maior por causa de uma praga que afeta a mandioca, base da alimentação local. Também querem mudar de lugar o aeroporto e o lixão que ficava perto para uma área a um metro de distância de uma terra indígena importante. Oiapoque, onde seria a base de operação da Petrobras, é muito pequena territorialmente, porque está limitada pela fronteira com a Guiana."

IMPACTO SOCIAL

O projeto da empresa petrolífera compreenderia a exploração de 16 poços, entre 2023 a 2027, na Margem Equatorial brasileira, extensão de 2.200km que cobre os estados entre o Amapá e o Rio Grande do Norte. A Petrobras lançou um novo pedido para o Ibama em outubro, ainda sob análise do instituto. A gerente geral da Petrobras, Sylvia Anjos, afirma que a exploração da bacia na Foz do Amazonas é segura e vai gerar um boom econômico na região.

Mas o coordenador de Gestão Ambiental e Sustentabilidade da PUC-Rio, Marcelo Motta, salienta que o impacto ambiental não resultaria apenas de um potencial vazamento de petróleo, mas das mudanças sociais e econômicas do local. “A indústria petrolífera pode gerar oportunidades de emprego localmente, mas também pode ocasionar deslocamentos e modificar os estilos de vida das comunidades locais”, explicou o ambientalista.

Luís Barbosa, gestor de mídia e conteúdo do Observatório do Marajó, também alerta que a exploração apresenta riscos para a região da costa no litoral norte brasileiro. Na ilha de Marajó, por exemplo, mais de 50% da população na região é rural, e grande parte dela composta por comunidades tradicionais: quilombolas, ribeirinhas ou indígenas, que podem ser gravemente afetadas pela exploração. Barbosa ressalta que o Marajó é uma região fundamental para o equilíbrio do Rio Amazonas e uma das mais baixas do litoral brasileiro, ou seja, com as mudanças climáticas há um alto risco mar engolir a própria ilha, além dos riscos de vazamento. 

“Desde o princípio nós nos posicionamos contrário (à exploração), considerando que não era um projeto que visava benefício para as populações locais, mas atender interesses econômicos. E que além de todos os impactos provocados pela crise climática na Amazônia, com a elevação da temperatura, não faz sentido abrir uma nova fronteira de exploração de combustíveis fósseis até 2050”. O representante do Observatório da Marajó defendeu a discussão de uma transição energética justa.

A Petrobrás argumenta que já perfurou mais de 6 mil poços no mar e nunca houve acidente operacional e ressalta que existe um plano de segurança em caso de um eventual acidente.

"Existe um plano de segurança muito grande e bem estruturado em caso de um eventual acidente. São vários barcos de apoio, helicópteros em standby e um rigoroso procedimento seguido pelos funcionários, que receberam forte treinamento e muitos com experiência de muitos anos de muita perfuração", afirma Sylvia Anjos.

Mas especialistas enfatizam que os problemas não são apenas os potenciais derrames, mas os riscos ambientais indiretos da exploração do petróleo na área, como poluição da água e a perda de biodiversidade. Esses fatores já prejudicam as comunidades que dependem do meio ambiente para sobreviver.

RISCOS AMBIENTAIS INDIRETOS

Felipe Germini, empresário no ramo de consultoria em petróleo, disse que a exploração já causou danos significativos a outras bacias fluviais do mundo, como o Delta do Níger e do Mississippi. "A Amazônia recebeu menos exploração do que qualquer outro lugar, mas devido à sua única biodiversidade e cultura, qualquer impacto pode ser amplamente significativo", ressaltou o consultor.

O Plano Estratégico da Petrobras prevê um investimento de US$ 2,9 bilhões na região nos próximos cinco anos. Beto Veríssimo, presidente do Imazon, salienta a necessidade de pesquisa prévia de todos os efeitos ambientais diretos e indiretos na região. Pesquisador da Amazônia, ele afirmou que a biodiversidade do Amapá está muito bem conservada e alertou que se houver um aumento do desmatamento, ele poderá estar relacionado à especulação do desenvolvimento na região.

"O primeiro sinal é saber se vamos ter alguma corrida na região do Amapá que esteja provocando desmatamento. Se a gente tiver alguma mexida nos dados do desmatamento, teremos que começar a ver se isso tem a ver com a expectativa desse projeto."

Mesmo que a Petrobras seja uma das 20 empresas mais poluidoras no mundo, segundo pesquisa do Climate Accountability Institute, a gerente geral da empresa disse que o  Brasil precisa explorar  a área para não depender de petróleo estrangeiro. "Não devemos simplesmente copiar os modelos europeus, que não possuem petróleo e emitem mais de 30% do total de CO2 mundial", afirmou Sylvia Anjos.


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